O ajuntamento é maior à sexta-feira, dia sagrado para o islão. A fila diverge, para um lado está a mesquita na Rua do Terreirinho, mais pequena, para o outro a do Centro Islâmico do Bangladesh, no beco de São Marçal.

Rua do Benformoso abaixo e Calçada Agostinho de Carvalho acima, à medida que se aproxima a uma hora da tarde, são mais e mais os homens que se vão posicionando, velhos e novos, crianças até, de origens variadas, mas com predomínio do continente asiático.

Na troca entre orações, quem lá está dentro sai rapidamente, mesmo por calçar, para não se perder tempo. Lá fora há quem espere há mais de duas horas.

Com lotação para 500 pessoas e duas salas atapetadas, uma em cima e outra em baixo, o Centro Islâmico do Bangladesh espera por uma nova localização, prometida pela Câmara de Lisboa há 12 anos – era António Costa presidente do município.

O atual espaço, comprado pela comunidade do Bangladesh há muitos anos, não oferece segurança a todos os fiéis que o procuram, reconhece Rana Taslim Uddin, presidente do Centro Islâmico do Bangladesh, que, quando chegou à Mouraria, em 1991, era um de seis cidadãos oriundos do Bangladesh.

“Esta mesquita não tem condições como deve ser, porque não tem saída de emergência, não tem janelas, […] no calor fica muito difícil”, relata, estimando que é necessário um local de culto “para mais ou menos duas mil pessoas”.

Atualmente, estima-se que vivam em Portugal cerca de 60 mil bengalis, dedicados sobretudo ao comércio.

Na altura do Ramadão, mês sagrado para os muçulmanos, os muçulmanos da Mouraria não conseguem sequer quebrar o jejum em conjunto, como dita a tradição. E o atual local de culto não tem sala de orações separada para mulheres.

Há dias, Rana convidou o atual presidente da Câmara de Lisboa, Carlos Moedas (PSD), para visitar a mesquita.

“O novo presidente ainda não deu resposta”, disse à Lusa, lamentando: “Os políticos estão nos momentos, mas depois esquecem.”

O atual local de culto “é desadequado para a tanta gente que leva”, concorda Miguel Coelho, presidente da Junta de Freguesia de Santa Maria Maior (PS), considerando que é “absolutamente necessário” cumprir “o compromisso assumido” e “votado por todas as forças políticas da cidade, incluindo os representantes da direita democrática, o PSD e o CDS”.

O novo espaço é necessário “precisamente para que estas pessoas não tenham necessidade de criar mesquitas informais em espaços de garagem ou de loja”, assinala.

O projeto de construção de uma nova mesquita na Mouraria, que surgiu em 2012, está, desde então, envolto em protestos e atrasos.

Inicialmente estava prevista a demolição de edifícios para a criação de uma praça que permitisse aceder ao local de culto através de uma passagem pedonal entre a Rua da Palma e a Rua do Benformoso.

Em 2015, o assunto voltou a ser discutido em reunião pública da Câmara de Lisboa, desta vez para pedir à Assembleia Municipal que aprovasse a declaração de utilidade pública da expropriação dos prédios necessários à execução do projeto – proposta que foi aprovada por unanimidade.

No entanto, a contestação nos tribunais à expropriação de dois edifícios, por parte dos proprietários, questionando o valor da indemnização, atrasou todo o processo e, posteriormente, o executivo camarário admitiu reformular o projeto.

Em junho de 2023, o PS na Assembleia Municipal de Lisboa criticou o “ruidoso silêncio” sobre o projeto de construção da mesquita na Mouraria.

Em resposta, o vice-presidente da câmara, Filipe Anacoreta Correia (CDS-PP), disse que o município desenvolveu todos os procedimentos que tinha de fazer sobre o projeto da mesquita na Mouraria e “não houve nenhuma decisão” em relação a essa matéria.

Questionada pela Lusa sobre os planos para a construção de uma nova mesquita na Mouraria, a Câmara Municipal de Lisboa não respondeu.

A zona da Mouraria concentra hoje uma significativa comunidade oriunda do Sul da Ásia, na maioria do Bangladesh, Índia, Nepal e Paquistão.

Os comerciantes da zona queixam-se que a atual situação – com elevada concentração de fiéis muçulmanos na via pública, nomeadamente à sexta-feira – é prejudicial aos negócios.

“As pessoas não cabem todas lá dentro e têm de rezar na rua e isso, de facto, por vezes causa estranheza, mas nada mais do que isso”, sublinha Miguel Coelho.

“Não temos aqui um conflito religioso”, assegura o presidente da junta.