Faltam ações e políticas concretas, as boas práticas e exemplos de algumas escolas não são visibilizados nem replicados e muitos dos agentes educativos (professores e psicólogos) não reconhecem o problema, com as escolas a assumirem-se como espaços de reprodução de estereótipos, ao invés de os combater, disse à agência Lusa a investigadora do CES Lina Coelho e coordenadora do estudo “Fronteiras de Vidro - Custos e fatores da segregação profissional e educativa para homens e mulheres”.
O estudo, que foi desenvolvido entre 2020 e 2023 e cujos resultados foram apresentados na quinta-feira, conclui que a segregação sexual se mantém, centrando-se no ensino secundário profissional, referiu Lina Coelho.
Existem cursos do ensino profissional público com mais de 90% de frequência masculina (desde logo cursos como veículos a motor, metalurgia, eletrónica ou tecnologias de informação), e outros com uma participação feminina inferior a 30%, como é o caso das áreas da agricultura, desporto ou construção civil.
Já as áreas de cabeleireiro e estética, educação ou saúde têm uma presença feminina maioritária (mais de 80%).
“O diagnóstico dessas estatísticas permite perceber que a formação profissional no ensino secundário pública é ainda mais segregada em termos de género do que o próprio mercado de trabalho”, vincou a investigadora.
Para além do estudo quantitativo, o projeto realizou ‘focus groups’ e entrevistas a psicólogos escolares e professores, bem como a empregadores que acolhem estagiários das escolas, maioritariamente na região Centro.
“Desta análise mais qualitativa, resulta a conclusão de que as conceções estereotipadas continuam muito predominantes, não apenas nas empresas, mas também no próprio sistema de ensino. A sensibilidade à igualdade de género é muito reduzida no setor da educação”, constatou Lina Coelho.
Apesar de haver exceções e “bons exemplos”, esses não encontram “capacidade reprodutiva” e acabam por não ser replicados, vivendo do voluntarismo de dirigentes escolares ou professores, referiu.
“Há uma necessidade imperiosa de formar as pessoas para a igualdade de género e logo na formação básica na universidade, nas licenciaturas em psicologia e na formação de professores”, defendeu.
Segundo a coordenadora do projeto, as escolas continuam “espaços de produção de estereótipos” e o problema não é reconhecido pelos agentes educativos.
“Quando professores e psicólogos não reconhecem o problema não se age sobre ele. Eu creio que o problema é reconhecido em termos políticos, mas depois, de facto, não há atuações efetivas que proporcionem esta sensibilização de forma generalizada”, afirmou Lina Coelho.
Numa sociedade em que continua a persistir a ideia de profissões para homens ou para mulheres, os estereótipos são interiorizados pelas jovens e suas famílias, que não encontram nas escolas qualquer tentativa de os contrariar, aclarou.
Esse problema acaba por ter reflexos em perspetivas de carreira e de remuneração, com as jovens a acabarem por escolher áreas onde os salários são mais baixos, em detrimento de outras, como é o caso das tecnologias, onde há uma maioria de rapazes a ingressar nos cursos.
“Atendendo às tendências do mercado de trabalho e aos padrões de remuneração excecionalmente elevados nessas áreas e com muitas oportunidades de trabalho, é incompreensível, é irracional as mulheres não escolherem estas áreas”, constatou.
Com um mercado de trabalho atual e futuro que valoriza a área das tecnologias, prevê-se que a desigualdade salarial se mantenha ou até possa ser acentuada face à segregação sexual que se continua a assistir na hora dos mais jovens escolherem os seus percursos de formação, alertou.