Segundo notícia do ECO, o governo norte-americano enviou cartas às empresas portuguesas que lhe fornecem bens e serviços, informando-as de que devem abandonar os seus programas de diversidade, equidade e inclusão (DEI), de acordo com a ordem executiva assinada em janeiro por Donald Trump.
O envio das cartas foi confirmado ao ECO pela embaixada dos EUA em Lisboa e, segundo a imprensa internacional, foram enviadas cartas semelhantes a empresas de outros países da União Europeia, como França e Bélgica. No entanto, a embaixada não especifica ao ECO quantas cartas foram enviadas, nem revela quais as empresas visadas.
Questionada sobre as sanções que serão aplicadas caso as empresas não cumpram a ordem executiva, a embaixada dos EUA em Lisboa disse ao ECO que não serão feitos quaisquer controlos, para além de pedir aos contratantes que autocertifiquem o cumprimento das regras em causa.
"A embaixada dos EUA em Portugal está a realizar uma revisão global padrão dos contratos, que se aplica a todos os fornecedores e beneficiários de subsídios do governo dos EUA. Este processo inclui um pedido de certificação para garantir o cumprimento das leis anti-discriminação dos EUA", disse fonte oficial da embaixada ao ECO.
O documento assinado por Donald Trump defende que estes programas DEI enfraquecem a "unidade nacional" dos Estados Unidos, uma vez que "negam, desacreditam e minam os valores tradicionais americanos de trabalho árduo, excelência e realização individual", favorecendo um sistema "corrosivo" baseado na identidade. Por outras palavras, para Trump, qualquer programa que promova a diversidade, a equidade e a inclusão entra em conflito com a meritocracia e é, portanto, uma forma de discriminação.
Contratos
Existem essencialmente três blocos. O primeiro diz respeito aos serviços prestados à própria embaixada dos EUA em Lisboa, que naturalmente compra localmente. Aqui há de tudo, desde os serviços de telecomunicações da Vodafone aos trabalhos de jardinagem ou o seguro de saúde da Allianz, bem como os serviços de apoio jurídico da CMS.
Um segundo grande bloco são os contratos nos Açores, relacionados com a presença da Base das Lajes, com vários fornecedores locais, como seguranças, pessoal de limpeza, serviços de transporte e até uma agência funerária. Mas também a Galp Açores, que vende combustível à base.
E há um terceiro bloco, mais geral, que inclui, por exemplo, a relação contratual entre a Fidelidade e a Força Aérea Americana, baseada na cobertura de seguros. Ou a prestação de serviços da Meo à Defence Information Systems Agency (DISA) ou, antes disso, à Força Aérea.
Em teoria, os Estados Unidos não têm o direito de obrigar as empresas da UE a pôr termo aos seus programas de diversidade, equidade e inclusão.
Mas na prática, e uma vez que se trata de "determinar as condições em que é possível as empresas fornecerem bens ou serviços à administração norte-americana", podem impor regras. Quem o explicou ao ECO foi José Luís Cruz Vilaça, sócio responsável pela área de prática de Direito da União Europeia, Concorrência e Investimento Estrangeiro das Antas da Cunha Ecija. "Se não cumprir as regras, não será aceite como fornecedor", sublinha o advogado.
Fornecedores portugueses
O ECO questionou várias empresas portuguesas com contratos com o governo norte-americano, mas parece haver um manto de silêncio em torno desta questão.
Os registos do Federal Procurement Data System, onde constam os contratos celebrados entre entidades públicas norte-americanas e qualquer prestador de serviços, revelam que entre as empresas com contratos aí registados, só no último ano, estão organizações como a Vodafone Portugal, a Fidelidade, uma empresa da Mota-Engil, uma empresa da Galp, a Caetano Automotive, os CTT, a Allianz Portugal, a MEO ou a sociedade de advogados Rui Pena, Arnaut & Associados (agora CMS Portugal).
O ECO perguntou a estas e outras organizações se tinham recebido a carta enviada pela embaixada dos EUA e o que iam fazer em relação ao assunto. A esmagadora maioria das empresas simplesmente não respondeu, e algumas afirmaram mesmo não ter recebido qualquer comunicação.