Portugal tem “uma falta crónica de mão-de-obra” que “só é compensada por estrangeiros”, disse à Lusa o presidente da Confederação dos Agricultores Portugueses, considerando que o fim das manifestações de interesse — recurso legal que permitia a regularização a quem chegasse com visto de turista e começasse a trabalhar — mostrou o quanto faltam imigrantes no tecido económico português.

“Nos últimos meses, vimos um reconhecimento dessa realidade. Acho que hoje todas as partes reconhecem que a economia portuguesa precisa de mão de obra estrangeira, o que não acontecia há alguns meses”, disse Álvaro Mendonça

e Moura.

No entanto, “temos que criar condições no país para acolher as pessoas com dignidade” e também é necessário “colocar em funcionamento os órgãos do Estado competentes nesta matéria”, disse o ex-embaixador, que destacou a contratação de 50 funcionários para a Direção Geral de Assuntos Consulares, para serem colocados em postos de emissão de emigrantes.

“O processo está em andamento, isso já está se movendo” e “entendo que há um espaço de meses aqui” até que “as coisas comecem a funcionar”, afirmou o líder que também pede mais “rapidez” da Agência de Integração, Migrações e Asilo (AIMA) na gestão dos casos pendentes.

O presidente da CAP elogiou a recente decisão do parlamento de criar “um regime transitório”, que permite a regularização de quem já estava em Portugal, mas ainda não cumpria todos os requisitos para o pedido de manifestação de interesse.

“Havia pessoas em Portugal que estavam pagando para a segurança social, em alguns casos até pagavam impostos e depois não conseguiam regularizar sua situação”, lembra.

Turismo

No que diz respeito aos setores da hotelaria e do turismo existem “picos de sazonalidade e produção”, pelo que, por enquanto, “ainda não há efeito direto de as manifestações de interesse terem terminado”, disse Rita Siza Vieira, vice-presidente, da Associação da

Hotelaria Portuguesa (AHP).

No entanto, o país está passando por um “bloqueio na entrada de pessoal”, o que pode causar sérios danos aos setores intensivos em mão de obra que precisam manter uma resposta à demanda do mercado.

“Cerca de 30% dos nossos trabalhadores são imigrantes, estão trabalhando, estão em forma e contextualizados”, mas é necessário “manter o fluxo de contratação” para atender à demanda turística.

A indústria hoteleira tem “necessidades transversais” de mão de obra, disse, comentando a possibilidade de cada setor estabelecer cotas de contratação, solicitadas pelo partido Chega.

“Esta é uma necessidade que afeta todos os níveis de funções e qualificações”, afirmou o líder, que exigiu que o Governo crie um modelo de identificação de pessoal dos consulados que assegure “um regime de segurança, mas com rapidez e transparência”, para responder aos operadores económicos.

Construção

Na construção, “a escassez de mão de obra é a principal restrição” e pesquisas com empresas indicam a “falta de cerca de 80 mil profissionais do setor, para atender às necessidades e realizar as obras já planejadas e programadas”, disse Reis Campos, presidente da Associação das Indústrias da Construção e Obras Públicas (

Aiccopn).

Essa falta de trabalhadores abrange “todos os níveis de qualificação” e “a mão de obra estrangeira tornou-se cada vez mais indispensável para garantir a execução” das obras, e já representa “cerca de 23% da força de trabalho”.

Atualmente, com o fim das manifestações de interesse, “só é possível contratar trabalhadores estrangeiros após a emissão dos respectivos vistos pelos postos consulares nos países de origem”, lembrou Reis Campos, que lamentou a “excessiva burocracia, rigidez e lentidão” dos processos.

O “reforço efetivo dos postos consulares, bem como a criação de canais e pontos focais de contato no terreno, é essencial para atrair trabalhadores imigrantes que o setor e o país carecem gravemente”, acrescentou.

A associação já propôs um “caminho verde de negócios” para simplificar e reduzir a burocracia na obtenção de um visto, com a concentração em uma única unidade que centraliza todos os serviços necessários do Estado, acrescentou Reis Campos, destacando que sem agilizar os processos será impossível realizar grandes obras públicas planejadas, como o novo aeroporto, a terceira ponte em Lisboa ou a rede ferroviária de alta velocidade.

“Consciente das crescentes dificuldades no recrutamento de trabalhadores, a Aiccopn já apresentou ao Governo um conjunto abrangente de propostas destinadas a promover o recrutamento e a qualificação dos recursos humanos necessários para atender às necessidades das empresas”, destacou Manuel Reis Campos.